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Pioneirismo e legado: memórias e relatos de Auditores-Fiscais aposentados que ajudaram a construir o Fisco

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Se hoje a categoria profissional dos servidores efetivos da Receita Estadual é fundamental para o funcionamento do Estado, muito se deve ao trabalho deixado pelos pioneiros e pioneiras da administração tributária

Se atualmente a categoria profissional dos funcionários do Fisco é considerada a elite do funcionalismo estadual, muito se deve ao legado deixado pelos Auditores-Fiscais aposentados. Foram eles que, por meio de trabalho árduo e de pioneirismo, pavimentaram o longo caminho para que a administração tributária goiana viesse a ser percebida com grande respeitabilidade e prestígio no seio da sociedade.

Para conhecermos um pouco da saga percorrida pelos que ajudaram a alçar o Fisco ao patamar em que se encontra atualmente, a Comunicação do Sindifisco-GO ouviu o depoimento de quatro Auditores-Fiscais aposentados. Em suas respectivas épocas, para além de ações políticas de governos, eles colaboraram enormemente, juntamente com outros auditores e auditoras aposentados, para que a sociedade goiana viesse a desfrutar de uma administração fiscal efetiva, eficiente e formada por quadros profissionais qualificados.

“Nosso maior legado foi ter deixado um ambiente mais seguro e tecnológico”

O Auditor-Fiscal aposentado Wilmar Nunes Pinheiro, atualmente é Presidente da Associação do Fisco de Goiás (Affego). Natural de Natividade (TO), ele entrou para os quadros da administração tributária goiana por meio de concurso público realizado em 1962. Administrado pelo governador Mauro Borges Teixeira, Goiás, àquela época, territorialmente falando, compreendia também o que hoje se constitui o Estado de Tocantins.

Os desafios do Fisco eram enormes na década de 1960. Wilmar Pinheiro conta que eram apenas duzentos ‘Fiscais de Renda’ — denominação do cargo de Auditor-Fiscal naquele período — para desenvolver um trabalho de natureza fiscal em um vasto território. Segundo ele não haviam recursos de informática e a locomoção entre os municípios era feita por rodovias cuja boa parte dos trechos eram em estradas sem pavimentação asfáltica, em uma época em que a população do Estado era majoritariamente rural:

Como era ser Auditor-Fiscal em sua época, e como é atualmente? Qual o paralelo entre o Fisco de ontem e de hoje?

Wilmar Pinheiro - A diferença é bastante grande. Naquela época, me lembro bem, não tínhamos nenhuma estrutura. O Fisco tinha muitas dificuldades para realizar as tarefas, até mesmo as conduções eram difíceis. Para se ter ideia, éramos os responsáveis pelo pagamento de todo o funcionalismo público, inclusive os magistrados. Era tudo manual, não tínhamos nenhum recurso de informática e elaboramos imensos relatórios. As agências de Coletorias não possuíam cofres e o transporte para se prestar contas em Goiânia era feito por meio de jipe Willis ou por Volkswagen Fusca. As ligações terrestres para a capital eram precárias, quase todas por estradas não pavimentadas. Eu como Auditor-Fiscal, na época nosso cargo se denominava ‘Fiscal de Renda’, saía pelo interior de forma bastante precária e pouco segura. Trabalhei em Formosa, por exemplo, uma região que naquela época era muito carente. Ou seja, era uma dificuldade muito grande para se trabalhar. Nós autuávamos logo de cara as empresas em débito com o Fisco. Tínhamos que notificar com um prazo de 20 dias para que o contribuinte pagasse ou entrasse com um recurso de defesa. Passado o prazo e o notificado não tivesse pagado, nós tínhamos que voltar e autuar novamente. Então era um cenário de muita dificuldade, muito diferente do Fisco de hoje.

Atualmente, a Receita Estadual tem 601 Auditores-Fiscais em ativa. Trata-se de um efetivo deficitário diante das demandas cada vez mais crescentes do Fisco. Mesmo assim, os servidores conseguem desenvolver um bom trabalho que é refletido na alta da arrecadação como o registrado no 1º trimestre de 2022. Qual é o principal legado que os Auditores-Fiscais aposentados deixaram para os atuais que estão na linha de frente?

Wilmar Pinheiro - Hoje as facilidades são imensas. Os nossos colegas Auditores-Fiscais trabalham em um ambiente informatizado e não correm os mesmos riscos que passei em minha época. Nosso trabalho era cara a cara, às vezes era comum depararmos com contribuintes violentos que nos ameaçavam até de morte. Hoje não. Graças a Deus o ambiente para se trabalhar no Fisco melhorou bastante. Nos dias de hoje os auditores não saem de casa em casa, comércio a comércio como fazíamos em meu tempo. Saíamos com uma pastinha em mãos e batíamos na porta das empresas realizando os procedimentos fiscais. O pessoal de hoje tem muito mais tranquilidade para trabalhar. Assim sendo acho que o nosso maior legado foi deixar um ambiente mais seguro e tecnológico para o Fisco. Tanto é que a arrecadação goiana atualmente tem melhorado, o que demonstra que o pessoal de hoje tem feito um bom trabalho com bastante eficiência, apesar do efetivo ser aquém do necessário. O trabalho com afinco é ótimo não somente para o Fisco, mas para a sociedade goiana em geral que depende da arrecadação para suprir as demandas de governo, como infraestrutura, saúde, educação e segurança.

“Nós, sobretudo os mais antigos, temos no Fisco uma família”

A Auditora-Fiscal aposentada Dalvina Alves Cardoso certamente pode ser considerada uma das pioneiras do Fisco. A goiana de Inhumas (GO) foi uma das aprovadas no primeiro concurso público que admitiu mulheres para compor os quadros de carreira da administração tributária goiana, no cargo de ‘Exator’. O ano era 1968, o País vivia sob o Regime Militar e Goiás era governado por Otávio Lage de Siqueira.

Além das atividades específicas do cargo, Dalvina Cardoso foi assessora no Gabinete da então Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz), conselheira na Representação da Fazenda Pública e integrou o Conselho Administrativo Tributário. Ela foi professora de Legislação Tributária, ministrou aulas no Centro de Treinamento dos Funcionários do Fisco (CENTAF) e teve passagens em vários outros relevantes cargos de conselho e assessoria.

Como foi trabalhar como Auditora-Fiscal numa época em que era novidade mulheres nos quadros do Fisco?

Dalvina Cardoso - O meu concurso foi realizado em 1968 e foi o primeiro a admitir mulheres na carreira do Fisco. À época prestei concurso para o provimento do cargo de ‘Exator’, denominação nova para o então ‘Coletor de Tributos’. O nosso trabalho foi incipiente e encontramos bastante dificuldades por não termos recebido muito apoio. Éramos nós que conduzíamos a arrecadação e efetuávamos o pagamento do funcionalismo público do Estado. Então, estávamos à mercê de muitos riscos no cumprimento do serviço. Muito diferente de hoje, cujo trabalho é todo eletrônico. O trabalho atual do Fisco está bastante evoluído. Obviamente, os tempos são outros, o Estado progrediu e o Fisco acompanhou tal progresso. Não vou dizer que o trabalho das Auditoras-Fiscais atualmente é fácil. Digo que elas trabalham em um ambiente muito mais confortável se comparado ao de minha época. Fui uma das desbravadoras do Fisco e isso é para mim um motivo de muito orgulho.

Qual é a mensagem que a Sra. deixa às 139 Auditoras-Fiscais atualmente na ativa da Receita Estadual?

Dalvina Cardoso - Tudo que fazemos na vida tem que ser com amor. Quando colocamos o mais nobre dos sentimentos em nosso trabalho tudo dá certo. Nós, sobretudo os mais antigos, temos no Fisco uma família. Até porque nossa atividade nos exige muito, inclusive um isolamento de nossa família consanguínea, e de amigos que não são da classe, em razão da natureza de nosso trabalho. Portanto, aquela auditora que tem dedicação à classe, aos companheiros de trabalho, cria o que chamamos de fraternidade. A fraternidade é o melhor sentimento que devemos ter para viver neste mundo. Quando convivemos com respeito prestando solidariedade uns com os outros, colhemos bons frutos no ambiente de trabalho. Portanto deixo essa mensagem às colegas auditoras, ou seja, temos que eternizar o sentimento de fraternidade.

“A vontade de trabalhar e vencer era maior do que qualquer dificuldade”

Justino Ferreira Campos, atualmente, Diretor de Aposentados e Pensionistas do Sindifisco-GO, acredita que o otimismo é fundamental para o Auditor-Fiscal superar obstáculos inerentes ao trabalho. Aposentado do Fisco desde 1995, o goiano/tocantinense de Pium (TO) ingressou na Receita Estadual para o cargo de ‘Agente Arrecadador’ em 1976, na gestão do governador Irapuan Costa Júnior.

À época, o Fisco contava com o efetivo de 1.200 servidores. Eram 200 ‘Fiscais de Renda’, 500 ‘Fiscais-Arrecadadores’ (trabalhavam em postos fiscais e realizavam o trabalho de fiscalização de mercadorias em trânsitos) e 500 ‘Agentes Arrecadadores’, cujo trabalho era realizado nas antigas Agências de Fiscalização e de Arrecadação dos Tributos Estaduais (Agenfa). Os três cargos supracitados correspondem, atualmente, ao de Auditor-Fiscal.

Justino Campos descreve que, trabalhar na administração tributária na década de 1970, era uma grande aventura. Apesar das dificuldades e da falta de estrutura, ele relata que os Auditores-Fiscais tinham um imenso ‘espírito de corpo’ e a consciência da importância do trabalho do Fisco para a sociedade.

Qual seria o maior legado que os Auditores-Fiscais aposentados deixaram à nova geração do Fisco?

Justino Campos - Vejo que o principal legado foi termos conseguido todas as ferramentas e tecnologia disponíveis hoje. Nós trabalhamos em uma época em que não se falava em tecnologia, ou seja, era tudo manual. Por meio de nosso estudo deixamos a ferramenta para o proveito do pessoal atual do Fisco.

Como era a Receita Estadual na década de 1970? Quais eram as dificuldades do Fisco naquele período?

Justino Campos - Ingressei no Fisco em 1976. Naquela época trabalhávamos com pouca estrutura. Comecei trabalhando na delegacia fiscal de Campos Belos que era extremamente precária. Para se ter uma ideia, em alguns postos fiscais não havia sequer uma mesa para se trabalhar. As estradas eram todas de chão. A melhor viatura que tínhamos era uma Chevrolet C14. Somente depois que o Estado forneceu o Jipe Willis e, a partir daí a coisa foi melhorando. Naqueles anos nós trabalhávamos sozinhos, não contávamos com a companhia de um colega ou de um policial. Atravessei muitos rios em balsas. Cheguei a atravessar um rio a nado para buscar a balsa manual na outra margem, para atravessar a viatura. Ou seja, a dificuldade enorme. Mas contávamos com um coleguismo e companheirismo enorme. Nossa vontade de trabalhar e de vencer era maior do que qualquer dificuldade ou desafio. Havia um espírito de corpo muito grande. O Fisco naquela época tinha um efetivo grande, porém com o tempo foi diminuindo. Lamentavelmente hoje temos um quadro na faixa de 600 Auditores-Fiscais.

Qual a mensagem que o senhor deixa aos colegas Auditores-Fiscais da ativa?

Justino Campos - A principal mensagem que deixo é de otimismo, ou seja, de gostar do que faz. É preciso desempenhar a função com honestidade. O Auditor-Fiscal sem honestidade não é auditor. É preciso ter vontade de vencer, de colaborar com a sociedade e ter consciência da importância do seu trabalho para o desenvolvimento do Estado.

“Nós, os aposentados do Fisco, estamos sempre prontos para ajudar com nossa experiência”

Goiano de Carmo do Rio Verde, o Auditor-Fiscal aposentado, Hugo Maria D’assunção, atualmente é Diretor Vice-Presidente do Sindifisco-GO. Ingressou na carreira do Fisco como efetivo, por meio de concurso público, em 1984, durante a gestão do então governador Iris Rezende Machado.

O Fisco, naquela época, contava com um quadro de mais de mil Auditores-Fiscais. Ou seja, no aspecto de efetivos, era uma realidade completamente diferente da atual. Mesmo assim, os desafios de tocar a administração tributária eram hercúleos. Ao longo da carreira, Hugo D’assunção percorreu praticamente todas as regiões do Estado, com passagens por Formosa, São João d'Aliança, Inhumas, Ceres, Goianésia, Morrinhos, Catalão e Goiânia.

Como era o Fisco na década de 1980 e quais eram os principais desafios naquele período?

Hugo D’assunção - Entrei no Fisco em 1984 e nessa época praticamente dobramos a arrecadação. Nós enfrentávamos problemas sérios de locomoção pelo Estado já que muitas estradas ainda não eram asfaltadas. O território que é hoje o Estado de Tocantins pertencia a Goiás e vários Auditores-Fiscais foram lotados para trabalhar na região do Bico do Papagaio, extremo Norte do Estado. Eu mesmo trabalhei em Porto Nacional, atualmente, um município tocantinense. Acredito que nossos colegas da ativa estão mais tranquilos nesse sentido, de locais de lotação. Vejo que, apesar dos problemas que ainda temos no Fisco, o nosso pessoal tem feito muito e ajudado o Estado a arrecadar bastante. Acredito que as bases e os fundamentos para o bom trabalho desenvolvido hoje teve seus alicerces plantados pelos esforços dos Auditores-Fiscais aposentados. Parabéns aos colegas da ativa! Nós, os aposentados do Fisco, estamos sempre prontos para ajudar com nossa experiência.

Além do número de efetivo, quais outras diferenças entre o Fisco de quando o Sr. entrou para o de hoje?

Hugo D’assunção - Não podemos fazer essa comparação porque hoje temos instrumentos e ferramentas de trabalho informatizado. A informática é o maior diferencial, com softwares que ajudam bastante o trabalho do Fisco. Cada época tem sua particularidade, ou seja, não tem como comparar. Digo que os valores são os mesmos. A influência do Fisco na sociedade e a importância do trabalho que é fundamental para prover o Estado de benfeitorias na saúde, educação e segurança, além do custeio da máquina pública estadual, não deixam de ser semelhantes.